No dia 5 de novembro, o Cineclube Pedagogias da Imagem se reuniu para a última sessão do ano com a exibição do longa Ela (Her), de Spike Jonze, seguida da palestra Inteligência artificial: entre promessas futuras e realidades presentes, com a antropóloga Carolina Parreiras.
O filme não mede esforços em nos aproximar do protagonista, Theodore, que passa pela dolorosa separação de sua parceira, Catherine. Ele é do começo ao fim um homem inegavelmente solitário. Vemos isto nas tantas cenas em que ele anda pelas ruas por conta própria, em direção contrária às outras pessoas, dando a ideia de não reconhecimento e estranhamento em relação a quem ou o quê está ao seu redor; nos momentos em que ele interage com o casal de amigos, Paul e Amy, eles nunca estão presentes no mesmo corte, evidenciando sua solidão.
Outro fator que colabora para esta imagem é a fotografia da obra – assinada por Van Hoytema. Ele a colore em tons quentes, nos convencendo à empatia e, ao mesmo passo, quase faz com que entremos na história e assumamos o papel do protagonista, tomando exatamente as mesmas atitudes dele, tão mergulhados em uma compreensão que antes parecia impossível: quem diria que uma obra cinematográfica seria capaz de nos convencer a amar um sistema operacional?
Samantha, encantadora a princípio – só por simplesmente carregar a voz de Scarlett Johansson -, não demora muito para nos fazer levantar dentro de nós questionamentos acerca dos limites da tecnologia e do indivíduo, tão banhada de humanidade que chega a aproximar as duas coisas de maneira que, de vez em quando, por descuido, as enxergamos como uma só. Ela se prova digna de um voto de confiança quando traz indagações quase tão velhas e perpétuas quanto o tempo em que estamos neste mundo, como a questão da consciência e corporeidade: penso, logo existo. Por que isso não serviria para ela?
Esta obra especulativa com certeza foi semente de um intenso debate, que foi da exploração do caráter benéfico ou prejudicial da tecnologia, em relação com o problema da solidão. Podemos nos perguntar se as coisas são mesmo tão simples assim: será que a tecnologia é mesmo uma grande vilã, ou estamos distraídos demais para enxergar a quem realmente pertence a culpa? Pensamos sobre os contextos em que ela se origina e circula, o que nos permite entender que nem mesmo sua extinção impediria a alienação e todas as consequências que lhe sucedem.
Além disso, no debate, tivemos reflexões sobre o quão atual é o filme, apesar de ter sido produzido há pouco mais de dez anos. Quem sai de casa hoje sem seu smartphone? Ou melhor, quem não sente, de vez em quando, que este dispositivo é como a nossa casa, com todas as coisas belas aos nossos olhos, as músicas que amamos, todos os contatos que nos interessam… Fazemos dele um armazenamento de quem somos e cada vez ele nos conhece mais. É a partir desta confiança que nele depositamos que são gerados, por sua vez, anúncios capazes de seduzir, a ampliação da publicidade e da vigilância, uma manobra de aproximação que não se difere muito da de Samantha. Não é como se estivéssemos cotidianamente conferindo uma vida ao nosso aparelho? Afinal, quão diferente somos de Theodore? Não estaríamos todos experienciando um pouco a solidão e suas estranhas soluções à nossa disposição?
Mas não percamos o foco: Her é, acima de tudo, uma história de amor transumanista e humanista ao mesmo tempo: primeiro, nos provoca esta imersão e identificação, para depois provar a nossa natureza complexa e o reflexo dela em nossas relações interpessoais; as múltiplas possibilidades do romance como múltiplas possibilidades humanas, mas acima de tudo o reconhecimento de uns nos outros por meio da solitude.
Texto: Julia Facundo – extensionista do projeto Pedagogias da Imagem
Fotos: Carolina Moreira – extensionista do projeto Pedagogias da Imagem
Na sessão de encerramento do ano, o cineclube Pedagogias da Imagem traz o longa-metragem “Ela” (Her – EUA, 2013), de Spike Jonze, seguido da palestra Inteligência artificial: entre promessas futuras e realidades presentes com a antropóloga Carolina Parreiras.
O filme conta a história de Theodore (Joaquim Phoenix), um homem que busca superar o divórcio e recorre a um sistema operacional baseado em inteligência artificial, como tentativa de combater a solidão. Ele acaba se apaixonando por Samantha, voz do sistema operacional, dublada pela Scarlett Johansson.
‘Ela’, de pouco mais de dez anos atrás, é o último longa do Spike Jonze até a data de hoje. O filme evoca uma ressonância com ‘Encontros e desencontros’ (Lost in translation – EUA, 2003), da Sofia Coppola, diretora que ainda era casada com Jonze na época, de quem se divorciou pouco depois. O filme de Jonze poderia ser lido também como uma resposta e até um pedido de desculpas. Em ‘Encontros e desencontros’, a personagem Charlotte (também interpretada pela Scarlett Johansson), se sente sozinha e coadjuvante em meio às viagens do marido, atravessando um período de mudanças até encontrar Bob (Bill Murray). Em ‘Ela’, Samantha paralelamente se aprimora e se compartimenta para “viver” mais, explicitando como as personagens masculinas, Theodore e John – marido da Charlotte -, estão presos em uma fantasia do que seria esse amor.
Spike Jonze possui uma carreira marcada pela diversidade de produções, sendo também produtor, diretor de videoclipes, filmes esportivos de skate, roteirista e diretor. Seus filmes mais autorais costumam levar tempo para ser produzidos (ao longo de 25 anos, ele possui apenas 4 longas em sua filmografia mais autoral). Seus primeiros longas foram parcerias com o roteirista Charlie Kaufman, ‘Quero ser John Malkovich’ e ‘Adaptação’. Ambos os filmes ajudaram a pavimentar um estilo ágil e cerebral que seria a marca de seus trabalhos, articulando elementos introspectivos e filosóficos com a versatilidade da narrativa e da montagem, explorando temas existenciais e psicológicos, por vezes surreais.
Em ‘Ela’, Samantha passa por um processo dialético de humanização: ela se humaniza ao mesmo tempo em que é humanizada. Ela é um sistema que não desenvolve sentimentos, sendo as suas reações respostas ao seu uso, o modo pelo qual se adapta e se porta perante suas interações. Desta forma, o filme nos permite pensar sobre um tema cada vez mais presente no nosso cenário contemporâneo, o impacto e a capilarização de sistemas de inteligência artificial nas nossas vidas.
No dia 5/11, primeira terça-feira do mês, teremos a última sessão do ano do cineclube Pedagogias da Imagem. Nesta sessão de encerramento da temporada, exibiremos o filme ‘Her’ (Her – EUA, 2013), de Spike Jonze. O longa de ficção científica conta a história de Theodore (Joaquim Phoenix), um homem que passa a criar laços afetivos com Samantha, a voz feminina de um sistema operacional baseado em inteligência artificial (Scarlett Johansson).
Após a exibição, teremos a alegria e a honra de receber, como convidada do mês, a antropóloga Carolina Parreiras, professora do Departamento de Antropologia da Universidade de São Paulo e do Programa de Pós-Graduação em Antropologia da mesma universidade (PPGAS/USP). Ela é doutora em Ciências Sociais pela Unicamp, com pós-doutorados em Antropologia na USP e Unicamp. Ela coordena o LETEC – Laboratório Etnográfico de Estudos Tecnológicos e Digitais – USP.
Estaríamos vivendo em meio à ficção científica? Venha pensar conosco sobre um tema que tem invadido cada vez mais o cenário contemporâneo. Falar de inteligência artificial é evocar uma série de imaginários que vão desde as promessas de um mundo melhor até visões catastróficas de destruição ou substituição do humano pelas máquinas. Nesse encontro, a partir do filme, o objetivo é refletir sobre as potencialidades da inteligência artificial, questionando as visões que polarizam o uso de tecnologias como simplesmente boas ou ruins.
A sessão acontece no Auditório Manoel Maurício, do Centro de Filosofia e Ciências Humanas (CFCH). A entrada é franca e a atividade é voltada para o público geral, indicada para pessoas a partir de 14 anos.
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“Enquanto um ser querido continua desaparecido, é como estar em um limbo no inferno. Não há descanso um só dia”
No dia 24/09, o Cineclube Pedagogias da Imagem, projeto de extensão da Faculdade de Educação da UFRJ, apresentou a segunda sessão do semestre, exibindo o filme Ruído (Argentina/México, 2022), de Natalia Beristáin, no Auditório Manoel Maurício/CFCH. Para debater acerca do filme, a professora, filósofa e autora Susana de Castro foi convidada para o encontro, apresentando a palestra A crise dos narco-feminicídios no México.
O filme se caracteriza como uma ficção mesclada com a realidade, portanto, possuindo caráter semidocumental. Não há trilha sonora, há somente os sons (ruídos) das cenas, reforçando a imersão do espectador. Baseado em diversas histórias reais, o longa apresenta o descaso das autoridades com os casos de desaparecimento, mostrando como o dinheiro do narcotráfico corrompe as instituições, apresentando também as redes de apoio e solidariedade das famílias de desaparecidos.
Estas redes funcionam como uma alternativa criada pela própria população, atuando como um sistema de busca dos desaparecidos, pois a cada dia que passa, a possibilidade de encontrá-los com vida diminui, demarcando que o trabalho da polícia se resume a recolher os corpos, e não impedir as mortes.
Susana de Castro aponta a cumplicidade entre a polícia, o judiciário e o Estado nessa nova ordem embasada pelo narcotráfico. Um exemplo real da inoperância das instituições foi o caso dos “43 de Ayotzinapa”. Datado de uma década atrás, 43 estudantes mexicanos da Escola de Professores Rurais Isidro Burgos desapareceram. O último presidente, Andrés Manuel López Obrador, instaurou uma comissão da verdade e indicou uma resposta para o caso, afirmando se tratar de um crime de Estado. Além disso, o ex-procurador-geral do México, foi preso por ligação com o caso (que incluía desaparecimento forçado, tortura e obstrução da justiça). Atualmente, ele se encontra em regime de prisão domiciliar.
No desaparecimento mostrado no filme, Gertrudis, filha de Julia, passa por uma constante “revitimização”, isto é, pela recorrência de se apontar uma falha na vítima como justificativa para o acontecido: quando as autoridades evocam, por exemplo, o uso recreativo de drogas que Gertrudis fazia com amigos. De acordo com relatos reais, esse é um modus operandi, principalmente quando se trata de mulheres desaparecidas.
Julia faz três coisas para tentar encontrar a filha: contatar inicialmente a polícia, o que a levou a procurar a filha esperando que ela estivesse morta; ir a um abrigo de mulheres que foram vítimas de algum tipo de sequestro, além de realizar buscas de restos mortais com outras mulheres que também possuem familiares desaparecidos. A iniciativa das buscas, que deveria ser tocada pela polícia forense, é da própria população mexicana, demonstrando mais uma vez o descaso governamental. A ausência de um corpo é pavorosa, pois ainda permite a esperança de que a pessoa desaparecida seja encontrada viva (neste ponto, é possível traçar um paralelo com o Brasil na época da ditadura militar).
Susana sinaliza que, na década de 90, os crimes da Ciudad Juárez mostraram um modelo de feminicídio ligado ao narcotráfico (portanto, um narco-feminicídio), que se alastrou pelo país. Segundo o Observatório Cidadão Nacional do Feminicídio (OCNF), mais de mil mulheres foram assassinadas desde 2008 somente nessa região. A partir da entrada das montadoras no México, por conta do custo da mão-de-obra, mulheres jovens começaram a trabalhar e, consequentemente, obtiveram mais autonomia, o que é levantado por Susana como uma motivação para as torturas. A mulher representa um ponto de união entre agressores, sendo a violência uma forma de assegurar o seu lugar de pertencimento no grupo, com caráter pactual (os integrantes não relatam o ocorrido), caracterizando uma afirmação coletiva. Apesar de haver vínculos de proximidade entre os locais em que os corpos apareciam e fazendas relacionadas ao narcotráfico, bodes expiatórios são usados para mascarar esta “coincidência”.
O México possui a ‘Lei Geral de Acesso das Mulheres a uma Vida Livre de Violência’, datada do ano de 2007. No entanto, o país não fez avanços quanto a esse problema, enfatizando a necessidade de uma mudança no país. Pela quantidade de mulheres desaparecidas e crimes não solucionados, pressupõe-se uma coesão moral dos cidadãos diante destes fatos. Para que uma mudança seja efetiva, o combate deve ser travado no campo cultural, moral, social, político e econômico. Os narco-feminicídios são alicerçados no sistema capitalista e algumas formas de resistência dos sujeitos são mostradas no final do filme, quando há repressão às mulheres que protestam. Se a luta democrática se vê diante destes desafios, somente uma mudança mais estrutural de sistema conseguiria garantir segurança às mulheres.
Por Julia Facundo e Isabela Felippe – Extensionistas do projeto Pedagogias da Imagem
Neste mês de outubro de 2024, o cineclube Pedagogias da Imagem recebe mais uma itinerância da Mostra Ecofalante de Cinema. Serão ao todo 4 dias do II Ciclo (Im)permanências: Desastres – Diálogos entre artes, humanidades e mudanças climáticas, com sessões no formato matinê e uma sessão regular. Exibiremos em cada dia um curta e e um longa-metragem do catálogo da mostra, sempre seguidos de mesas temáticas com convidados bastante especiais, desdobrando temas em ressonâncias com as questões socioambientais.
O Ciclo (Im)permanências, promovido pelo projeto de extensão Pedagogias da Imagem, surgiu em 2019 com o objetivo de ativar formas outras de abordar articulações entre as ciências e as artes, a educação e as humanidades, bem como os desdobramentos do presente para a divulgação científica e cultural frente às mudanças climáticas. Com uma programação de filmes e mesas de conferências, o ciclo será voltado à circulação de ideias interdisciplinares, propiciando um espaço de reflexão e discussão que explicite a relevância das pesquisas para uma ressignificação de sentidos sobre nossa relação com o mundo e o ambiente.
Em meio à 21ª Semana Nacional de Ciência e Tecnologia, ao longo deste mês em que acontece a COP16, na Colômbia, a realização do Ciclo (Im)permanências também tem como objetivo a abertura de caminhos plurais para situar problemas e pensar nossa atual era de catástrofes. Por meio dos trânsitos nomádicos entre áreas do conhecimento diversas – como a antropologia, as artes, a filosofia, as ciências sociais e a educação, busca-se a proliferação de diálogos que permitam entrever as composições éticas, estéticas, políticas e afetivas de modos de existência e produções de conhecimento em torno do ambiente, atravessados por um horizonte comum.
Nesta segunda edição, o ciclo explora a ideia-força dos desastres, entendidos não apenas como eventos catastróficos, mas como pontos de articulação capazes de reverberar visualidades e anseios que transbordam dos filmes e se abrem para discussões e desdobramentos de alianças, potências criadoras, resistências afetivas e políticas.
Neste ano de 2024, o ciclo ampliou sua duração e o número de convidados, percorrendo diferentes dimensões dos desastres, a sua relação com a(s) cultura(s) e a sociedade, buscando desnaturalizar esses eventos e abrir espaço para reflexões sobre seus efeitos nas maneiras de viver, resistir e habitar o mundo.
📌 Local: Auditório Manoel Maurício – CFCH (Campus Praia Vermelha – Avenida Venceslau Brás, 71 – Botafogo – entrada de pedestres também pela Rua Lauro Muller, 71).
Maré braba(Brasil, 2023), de Pâmela Peregrino. Duração: 7′.
Ela, que conecta a todos pelas suas águas, observa e opera as mudanças decorrentes do aquecimento global. O povo à beira-mar é o primeiro a sentir suas agitações e mudanças de humor. Ela sabe que os humanos estão se movendo para frear essas mudanças. Assim como ela sabe, que repetem uma antiga saga: alguns poucos prevalecendo sobre o grande restante, aprofundam os problemas criados por eles mesmos. Uma vez que você sabe(França, 2019), de Emmanuel Cappellin. Duração: 105’.
Desde os anos 70 do século passado, cientistas soam o alarme sobre um possível colapso ambiental induzido pela corrida desenfreada pelo crescimento, que ignora o conceito da finitude dos recursos naturais. Um grupo deles afirma que a oportunidade de evitar mudanças climáticas catastróficas já passou. A partir daí, perguntam: como se adaptar ao colapso? O filme leva os espectadores a uma jornada íntima pelo abismo de um mundo à beira da catástrofe, na interseção entre ciência climática e desobediência civil. Entrevistas com Richard Heinberg, Jean-Marc Jancovici, Saleemul Huq, Susanne Moser, Pablo Servigne.
Convidadas:
Jacqueline Girão (Faculdade de Educação/UFRJ) Martha Werneck (Escola de Belas Artes/UFRJ)
Dia 18/10 Erosão, racismo e gentrificação climática
10h – Filmes:
Mar concreto (Brasil, 2021), de Julia Naidin. Duração: 14’.
Como um exercício de resistência, Sônia acompanha o processo de erosão que vem sendo causado pelo mar que, dia após dia, avança pela praia, se aproximando do muro de sua casa. Ela faz registros diários desse processo e, por meio deles, constrói um vínculo afetivo com um território que desaparece – uma prosa solitária que desafia a tragédia final. Arrasando Liberty Square (Razing Liberty Square, 2023), de Katja Esson. Duração: 86’.
À medida que o aumento do nível do mar ameaça a luxuosa orla marítima de Miami, os proprietários ricos se dirigem aos terrenos mais elevados. Os moradores de Liberty Square, bairro historicamente negro e o primeiro projeto de habitação popular segregada no Sul, são o novo alvo de um projeto de “revitalização”, devido à sua localização, a 3,6 metros acima do nível do mar. Nesse panorama, o documentário discute a crise da habitação acessível, o impacto do racismo sistêmico e a gentrificação climática.
Convidados:
Andressa Dutra (Gestora ambiental IFRJ e mestranda em Ecoturismo e Conservação – UNIRIO) Julia Naidin (Artista pesquisadora – CasaDuna e UENF) Fernando Codeço (Artista pesquisador – CasaDuna e Encontros Hemisféricos)
Mymba Guata é um curta-metragem realizado coletivamente com jovens guarani, resultado de uma oficina de stop motion na Escola Viva Guarani – Ponto de Cultura Mbya Arandu Porã, na Terra Indígena Rio Silveiras. Trata sobre a caminhada dos bichos em busca da Terra Sem Males, seguindo o território, o bom caminho e o Teko Porã (Bem Viver) do povo Guarani Mbya.
A partir do universo de três povos indígenas pressionados pela destruição causada pelo garimpo, o filme propõe uma aproximação do pensamento dos Yanomami, Munduruku e Mebêngôkre (Kayapó), na formação de uma aliança histórica em defesa dos territórios. É, portanto, uma narrativa sobre resistência e resiliência, na figura de uma união inédita que firma a manutenção de seus territórios físicos e subjetivos. Para além da destruição causada pelo garimpo, este é um filme sobre a impossibilidade de separação entre a existência indígena e o seu território.
Convidadas:
Marcia Cabral (Superintendente de Saberes Tradicionais do FCC/UFRJ) Deborah Bronz (Antropologia/PPGA-UFF) Paula Scamparini (Escola de Belas Artes/UFRJ)
Águas turvas (Brasil, 2023), de Gabriel Panazio, Kleber Leão. Duração: 7’.
Localizada na famosa Baía de Guanabara, a Z10 é uma das mais antigas e tradicionais colônias de pesca do país. Neste curta documentário, acompanhamos a história de Zezinho, um pescador desta comunidade histórica, cuja vida é drasticamente alterada pela crescente poluição marinha. Com a diminuição dos peixes, Zezinho e seus colegas enfrentam uma crise de sustento e identidade. Numa reviravolta inspiradora, eles reinventam suas práticas, transformando-se de pescadores em guardiões do oceano. Ao ‘pescarem’ lixo, não apenas encontram um novo meio de subsistência, mas também emergem como figuras centrais na luta pela preservação ambiental. Este curta-metragem é uma jornada visual e emocional, destacando a resiliência humana diante de adversidades ambientais, e a capacidade da comunidade de encontrar soluções criativas para problemas globais.
Barragem(Brasil, 2021), de Eduardo Ades. Duração: 96′.
A luta dos atingidos pelo maior desastre ambiental do Brasil para obter reparação. Após o rompimento da barragem de rejeitos de mineração da Samarco, em 2015, os moradores de Bento Rodrigues ficaram sem casa e sem fonte de renda. Desilusão, desinformação, desunião, protelações e outras manobras marcarão o caminho de resistência dos atingidos ao longo dos anos.
Convidadas:
María Gabriela Scotto (Antropologia/PPGDAP-UFF) Mari Fraga (Escola de Belas Artes-UFRJ)
Bióloga, licenciada em Ciências Biológicas e doutora em Educação pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). É professora do departamento de Didática da Faculdade de Educação da UFRJ, atuando na licenciatura em Ciências Biológicas e no curso de Pedagogia. Coordena o coletivo de extensão e pesquisa “Educação Ambiental para professores da Escola Básica: perspectivas teóricas e práticas” (EAPEB). É docente permanente do Programa de Pós-Graduação em Educação da UFF. Desenvolve e orienta pesquisas sobre educação ambiental em contextos escolares, formação docente, políticas públicas, racismo ambiental e juventudes em movimentos ambientalistas.
Martha Werneck
Doutora em Artes Visuais pela Escola de Belas Artes da UFRJ. Desde 2007 é professora na Escola de Belas Artes pelo departamento de Artes Bases/ Pintura. Sua produção autoral envolve trabalhos predominantemente na área da Pintura, que transitam entre a investigação fotográfica, a imagem digital, a ilustração e o design, bases nas quais sustenta sua prática, poética e pensamento plástico. Werneck desenvolve a pesquisa O corpo feminino como poética na Pintura contemporânea, que trata da investigação da representação do corpo feminino, apoiada em leituras que buscam sobretudo a compreensão do campo do feminino e do feminismo, e em trabalhos autorais da pesquisadora. Sua produção autoral envolve trabalhos predominantemente na área da Pintura, que transitam entre a investigação fotográfica, a imagem digital, a ilustração e o design, bases nas quais sustenta sua prática, poética e pensamento plástico. Atualmente trabalha na série Pequenas Ofélias e Icebergs.
Andressa Dutra
Gestora Ambiental (IFRJ) e mestranda em Ecoturismo e Conservação (UNIRIO). Pesquisadora e articuladora comunitária, com foco no monitoramento do Turismo de Base Comunitária junto a Rede Nós da Guanabara. Faz parte do coletivo Cafundós que reúne pesquisadores interessados na cidade de Magé – Baixada Fluminense do Rio de Janeiro. Enquanto pesquisadora independente, tem se dedicado ao estudo do campo da ecologia política e justiça ambiental, entendendo a dinâmica do racismo ambiental nos diversos territórios e comunidades tradicionais, principalmente quilombos. Integra o Grupo de Estudos em Educação Ambiental desde el Sur, GEASur/UNIRIO e o grupo de pesquisa Observatório de Parcerias em Áreas Protegidas.
Julia Naidin
Doutora em Filosofia Contemporânea, na UFRJ. Desde 2017, atua com produção e curadoria na residência artística brasileira CasaDuna Centro de Arte, Pesquisa e Memória de Atafona, onde desenvolve uma pesquisa de metodologia em arte contemporânea e educação ambiental e é atriz do Grupo Erosão. Realizou seu primeiro curta-metragem, Mar Concreto (2021). É pesquisadora de pós-doutorado na UENF, no Laboratório de Estudos do Espaço Antrópico, com pesquisas articulando a noção de patrimônio ao fenômeno da erosão e desenvolvendo práticas de museologia social.
Fernando Codeço
Fernando Codeço é pesquisador, artista visual e diretor de teatro. Coordena a CasaDuna – Centro de Arte, Pesquisa e Memória de Atafona. Dirige o Grupo Erosão de teatro e artes visuais. Doutor em Artes Cênicas (UNIRIO e UPJV), com pós-doutorado em Políticas Sociais (UENF). Trabalha na fronteira com a antropologia, interessado na eco política das artes em contexto de emergência climática, em processos coletivos e participativos de criação e em práticas de museologia social.
Marcia Cabral
Atualmente é Superintendente de Saberes Tradicionais do Fórum de Ciência e Cultura da UFRJ, professora do Departamento de Terapia Ocupacional da Faculdade de Medicina e do Programa de Pós-Graduação em Psicossociologia de Comunidades e Ecologia Social (IP/CFCH) da UFRJ. Doutorado em Psicologia nos Estudos da Subjetividade pela Universidade Federal Fluminense (UFF). Coordena o Laboratório de Estudos Africanos, integrado às atividades e à Terapia Ocupacional -Isé; (Lab Isé) – UFRJ. É membro do Grupo de Pesquisa Laboratório de Memórias, Territórios e Ocupações: Rastros Sensíveis/UFRJ/CNPq e do Atividades Humanas e Terapia Ocupacional/ UFSCar/CNPq. Tem atuado, lecionado, orientado e pesquisado epistemologias afro-diaspóricas, investindo, mais especificamente, nos saberes dos Povos e Comunidades Tradicionais de Matriz Africana.
Deborah Bronz
Doutora e mestre pelo Programa de Pós-Graduação em Antropologia Social, do Museu Nacional, da Universidade Federal do Rio de Janeiro – PPGAS/MN/UFRJ. Professora do Departamento de Antropologia da Universidade Federal Fluminense – UFF e do Programa de Pós-Graduação em Antropologia PPGA/UFF. Graduada em Geografia pela UFRJ (2001). Jovem Cientista do Nosso Estado pela FAPERJ. Coordenadora do curso de graduação em Antropologia da UFF. Secretária Geral da Associação Brasileira de Antropologia – ABA, gestão 2023/2024. Vice coordenadora do Grupo de Estudos Amazônicos e Ambientais – GEAM/UFF e pesquisadora vinculada ao Laboratório de Pesquisas em Etnicidade, Cultura e Desenvolvimento – LACED/MN/UFRJ. Autora dos livros Nos Bastidores do Licenciamento Ambiental – Uma etnografia das práticas empresariais em grandes empreendimentos e Pescadores do Petróleo. Políticas ambientais e conflitos territoriais na Bacia de Campos, RJ. Co-organizadora do livro Terra arrasada: desmonte ambiental e violação de direitos no Brasil.
Paula Scamparini
Doutora em Artes Visuais pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), com pesquisa paralela à própria produção artística desenvolvida na linha de pesquisa Poéticas Interdisciplinares. Professora no bacharelado em Artes Visuais – Escultura na Escola de Belas Artes da UFRJ. Atua como artista e eventualmente diretora de arte. É artista visual com exposições individuais em diversos espaços, como o Instituto Guimarães Rosa (México, 2023) e o Centro Atlântico de Arte Moderno (Espanha, 2023). Participou de exposições coletivas em instituições como o Museo de Arte Moderno Jesus Soto (Venezuela, 2019) e a Fundação Vera Chaves Barcellos (Viamão-RS, 2018). Suas obras integram coleções de importantes instituições, incluindo o Museu de Arte Moderna do Rio (MAM-Rio) e a Fundação Bienal de Cerveira (Portugal). Realizou diversas residências artísticas, como no Museu Nacional Soares dos Reis (Portugal, 2017). É líder do Grupo de Pesquisa Arte: Ecologias (GAE).
María Gabriela Scotto
Doutora e mestre em Antropologia Social pelo PPGAS/Museu Nacional/ UFRJ. Possui graduação em Ciencias Antropológicas pela Facultad de Filosofia y Letras, da Universidad de Buenos Aires. Professora do Departamento de Ciências Sociais do Instituto de Ciências da Sociedade e Desenvolvimento Regional da UFF (Campos dos Goytacazes). É coordenadora do GEPPIR – Grupo de estudos e pesquisa sobre Poder, Imagens e Representações (UFF/CNPq) e pesquisadora do Núcleo de Estudos e Pesquisas Socioambientais (NESA/UFF). Tem experiência de pesquisa na área de antropologia social, com ênfase em questões socioambientais, Antropologia da Política e do desenvolvimento, atuando principalmente nos seguintes temas: antropologia da política, antropologia do cinema, poder e imagens, ativismo ambiental; participação política e ação coletiva, movimentos sociais e organizações das sociedade civil no Brasil e na América Latina, meio ambiente e conflitos sócio-ambientais. Desde 2010 coordena o projeto de extensão Cineclube SocioAmbiental Campos. No campo das organizações não-governamentais, foi Coordenadora Regional de Programas da ActionAid Americas, onde também coordenou a área de Pesquisa em Políticas Sociais na América Latina; atuou como pesquisadora no Instituto Brasileiro de Análises Sociais e Econômicas (IBASE) e como assessora da Federação de Órgãos para Assistência Social e Educacional (FASE). Participou na Coordenação do Mapa de Injustiça Ambiental e Saúde no Brasil (Fiocruz/Fase). É membro da Associação Brasileira de Antropologia (ABA) e da Sociedade Brasileira de Estudos de Cinema e Audiovisual (Socine).
Mari Fraga
Mari Fraga é artista, pesquisadora e professora no Departamento Artes Visuais / Escultura, Escola de Belas Artes, UFRJ. Doutora em Processos Artísticos Contemporâneos pela UERJ, é criadora e editora da Revista Carbono (www.revistacarbono.com) – publicação online que propõe diálogos entre pesquisas artísticas e científicas desde 2012. Foi doutoranda visitante na Konstfack University of Arts, Crafts and Design (Suécia), com bolsa Capes PDSE. Trabalha em diversas mídias, como escultura, fotografia, vídeo, pintura e instalações. Entre as principais exposições estão as individuais Minério-Hemorragia (Espaço Cultural Sérgio Porto, 2018), Tempo Fóssil, (Galeria Ibeu, 2016) e On Oil (SU Gallery Konstfack, Estocolmo, 2015). Investiga a intervenção do agente humano na natureza, a dicotomia entre natural e artificial, o Antropoceno e as Mudanças Climáticas, tomando como ponto de partida os combustíveis fósseis, o ciclo do carbono, a mineração e a exploração da terra, analogias entre corpo e Terra, e o ecofeminismo. Sua tese Do Fóssil ao Húmus: Arte, Corpo e Terra no Antropoceno, analisou combustíveis fósseis, arte e natureza, em abordagem prático-teórica. Integrante da Cooperativa de Mulheres Artistas e líder do grupo de pesquisa GAE – Arte e Ecologias, onde coordena o projeto de pesquisa GeoAstro-poéticas, que articula Artes, Geociências e Astronomia, e o projeto de pesquisa Agente Húmus: práticas cooperativas em arte, agroecologia e ecofeminismo. Tem prática multidisciplinar, com atuação na academia e no circuito das artes, realizando exposições, palestras, curadorias, oficinas e experimentos artísticos em diversas linguagens.
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Este evento contribui para alguns dos seguintes Objetivos de Desenvolvimento Sustentável no Brasil (ODS), da Organização das Nações Unidas (ONU):
A quem recorrer quando o estado que deveria te amparar te ignora e te deixa entregue à própria sorte? Na sessão de setembro, o Cineclube Pedagogias da Imagem traz esta e outras discussões a partir do filme Ruído (2022), de Natalia Beristáin.
Tendo em seu centro o desespero de uma mulher, Julia, à procura de sua filha desaparecida, a narrativa parte do 9º mês sem nenhuma notícia do paradeiro da jovem de 25 anos e mostra a rede de apoio formada por outras mulheres que tiveram a vida atravessada pela mesma tragédia.
Ruído é uma obra contundente. O filme é de caráter semi-documental, se tratando de uma ficção que recolhe resquícios de tantas realidades – ou vontades – no México e os transforma numa única história de tirar o fôlego. Beristáin já havia abordado temáticas de opressão de gênero no México em filmes anteriores, como no longa-metragem O eterno feminino (Los adioses, 2017). Em Ruído, ela toca num assunto delicado do país, os desaparecimentos e o descaso das autoridades, e toma forma de denúncia, seja pelas histórias nele compartilhadas, seja pelo modo com que o fazem.
Vale ressaltar o detalhe de sua capa, que é tomada pelo rosto de Julia em close, com sua boca cruzada por um rasgo de papel, evocando o silenciamento da personagem (a atriz Julieta Egurrola é a própria mãe da diretora). Isto nos prepara para muito do que há de vir, um intenso debate acerca da inevitável impotência daqueles tocados por este problema – como prosseguir quando nada lhe é assegurado?
Para a construção do longa, Beristáin realizou uma profunda pesquisa de campo, chegando a participar das buscas e tendo acesso ao verdadeiro movimento que é, de fato, incansável. Para ela, a rede de apoio que se forma nestes grupos, a partir do reconhecimento na dor do outro, é essencial não só para o fortalecimento do coletivo, mas pela desesperada necessidade de afeto entre aquelas que compartilham semelhante vivência, como um motor da esperança. Não somente, as mulheres presentes no grupo que Julia frequenta são mulheres reais, interpretando a si mesmas e contando suas histórias.
Esta escolha reforça o cunho de denúncia do filme, tanto por dar voz a estas mulheres, quanto por nos aproximar delas e, portanto, reproduzir em nós a sensação de impotência delas, a certo nível, tornando visíveis suas dores. Deste modo, Ruído carrega a premissa de deixar o espectador insatisfeito e indignado; é como deveríamos estar. Somente sendo intimamente perturbados é que se supõe que sejamos movidos.
A sessão ocorrerá no dia 24/9, no Auditório Manuel de Albuquerque (prédio do CFCH), no Campus da Praia Vermelha-UFRJ. Não perca.
Redação: Julia Facundo Isabela Felippe – Extensionistas do projeto Pedagogias da Imagem
No dia 24, última terça-feira do mês, teremos a sessão de setembro do cineclube Pedagogias da Imagem. Exibiremos o filme Ruído (Ruido, 2022), de Natalia Beristáin, co-produção da Argentina e do México que acompanha a busca de uma mãe por sua jovem filha desaparecida, mostrando seu encontro com uma rede de apoio e com diferentes histórias de vidas marcadas pela crescente violência contra as mulheres. O filme participou da mostra Horizontes Latinos na 70ª edição do Festival de San Sebastián, na Espanha onde obteve o VIII Prêmio da Cooperação Espanhola.
Teremos a alegria e a honra de receber novamente, como convidada do mês, a filósofa Susana de Castro, professora titular do Departamento de Filosofia e do Programa de Pós-Graduação em Filosofia da UFRJ. Ela é doutora em Filosofia pela Ludwig-Maximilians-Universität, Munique, com pós-doutorado em Filosofia na CUNY Graduate Center, Nova York. Autora, dentre outros, do livro ‘Filosofia e Gênero’ (2014). Integrante do GT Filosofia e Gênero, da Anpof – Associação Nacional de Pós-Graduação em Filosofia.
O encontro será um convite para refletir sobre a escalada da violência contra as mulheres em meio à guerra entre cartéis do narcotráfico no México, partindo deste cenário para explorar relações, estruturas e significados entre essa intensificação da violência, o machismo e a lógica do patriarcado.
A sessão acontece no Auditório Manoel Maurício, do Centro de Filosofia e Ciências Humanas (CFCH). A entrada é franca e a atividade é voltada para o público geral, indicada para pessoas a partir de 12 anos. Faça sua inscrição aqui. Aproveite para seguir o cineclube no Instagram, no Bluesky e no Threads. Será ótimo contar com qualquer apoio na divulgação.
Caso queira receber nossas divulgações e comunicados via WhatsApp, venha fazer parte do nosso grupo (restrito ao envio de divulgações). É só acessar este link-convite.
No dia 27/08, o Cineclube Pedagogias da Imagem, projeto de extensão da Faculdade de Educação da UFRJ, voltou do recesso com a primeira sessão do segundo semestre de 2024, apresentando o filme Sala dos professores (Alemanha, 2023), de İlker Çatak, no Auditório Manoel Maurício/CFCH. Para debater acerca do filme, a professora, filósofa e cineasta Angela Donini foi convidada para o encontro. Ela apresentou a palestra O colapso das relações no espaço educacional e a urgência de novos repertórios.
Provocando uma claustrofobia intencional, o filme se debruça sobre o drama de um aluno em ver sua mãe – uma professora da escola que dá palco à trama -, sendo acusada de um roubo pela também docente e protagonista, Carla Nowak, levantando um intenso debate sobre o apagamento do outro no ambiente estudantil, assim como sobre o lugar das promessas da educação diante de suas limitações enquanto produto do sistema.
No debate, um dos temas de maior importância foi a dinâmica do universo encapsulado: o filme é todo ambientado na escola; o enquadramento aperta o espectador, sua música o tensiona. O filme constrói, de maneira muito precisa, a ideia de um lugar sem saída, trazendo reflexões sobre como solucionar os problemas da pedagogia senão pela superação dos lugares de hierarquização, onde instintos são moldados e alunos são compreendidos somente na medida em que se submetem ao ordenamento moral. As barreiras impostas pelo modo (re)produtivista da escola estão em todas as suas instâncias, desde o tratamento da direção até nos próprios estudantes.
A naturalização do distanciamento dos docentes e gestores é mostrada, pela convidada, como uma ontologia não-relacional, a partir da qual se vislumbra uma exclusão das relações e afetos que constituem as personagens.. Tudo isso constitui um cenário de intolerância, onde nada é questionado e, portanto, nada é elaborado nem trabalhado. Mesmo assim, Carla busca atravessar as barreiras que a tornam tão distante de seus discentes usando uma das poucas armas que lhe restam – o afeto –, ao mesmo tempo em que também é vítima desse sistema. Carla, com sua sensibilidade, acaba atuando como uma possível resistência destas diretivas.
Angela Donini demonstra que, por mais que a professora tenha buscado uma abordagem empática, a estrutura educacional colapsa justamente porque é uma reprodução da sociedade, na qual a gestão da escola opta por fazer acordo com a polícia e a pedagogia policialesca mostrada ao longo da obra, justamente porque é a reprodução incontrolável do capital e a escola funciona enquanto uma aparelho ideológico do Estado que reproduz uma submissão aos discentes e poder aos professores.
A partir do filme Sala dos professores, podemos pensar em projetos exteriores à escola, capazes de produzir individualidade e subjetivações por meio da inclusão de crianças e adolescentes a partir de outras formas de acolhimento, que promovam a correlação entre arte, cultura e o espaço escolar, instrumentos de aproximação e reconhecimento, produzindo novas lugares éticos de produção de saberes e cuidados.
Nossa próxima sessão acontecerá no dia 24 de setembro, às 17h. Exibiremos o filme Ruído (Ruido – Argentina/México), de Natalie Beristain, seguido da palestra O caso dos narco-feminicídios no México, com a filósofa Susana de Castro (UFRJ). Anote e siga o projeto no Instagram, no Bluesky e no Threads para mais atualizações.
Redação: Julia Facundo Isabela Felippe – Extensionistas do projeto Pedagogias da Imagem
Fotos: Carolina Moreira – Extensionista do projeto Pedagogias da Imagem
Estamos de volta! Nesta última terça de agosto, 27/8, às 17h, acontecerá a sessão inaugural do semestre do cineclube Pedagogias da Imagem. Exibiremos o filme A sala dos professores (Das Lehrerzimmer – Alemanha/EUA, 2023), do diretor Ilker Çatak.
Indicado ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro, o filme acompanha a professora Carla Nowak (Leonie Benesch), envolta em uma rede de tensões disparada por uma série de roubos, acusações e preconceitos no ambiente escolar. O filme foi premiado em seis categorias no Prêmio do Filme Alemão (Deutscher Filmpreis) no ano passado: Melhor Filme, Diretor, Roteiro, Atriz e Edição.
Teremos a alegria e a honra de receber, como convidada do mês, a filósofa e cineasta Angela Donini, professora do Departamento de Filosofia da UNIRIO, do Mestrado Profissional em Filosofia e do Programa de Ensino de Artes Cênicas, também da UNIRIO. Ela dirigiu os curtas ‘Corpos que escapam’ (2015), ‘Ancorando navios no espaço’ (2016), ‘Nomes que importam’ (2017) e ‘Que minhas únicas cicatrizes sejam de sk8’ (2023). Ela é Doutora em Psicologia Clínica pela PUC-SP, com pós-doutorados em Medicina Social (UERJ) e em Estudos Contemporâneos das Artes (UFF).
O encontro será um convite para dialogarmos sobre a urgência em construirmos novos repertórios imaginativos e práticos para as relações que se estabelecem nos espaços educacionais.
A sessão acontece no Auditório Manoel Maurício, do Centro de Filosofia e Ciências Humanas (CFCH), campus Praia Vermelha da UFRJ. A entrada é franca e a atividade é voltada para o público geral, indicada para pessoas a partir de 12 anos.
Caso queira receber nossas divulgações e comunicados via WhatsApp, venha fazer parte do nosso grupo (restrito ao envio de divulgações). É só acessar este link-convite.
No dia 30/8, o Cineclube Pedagogias da Imagem retornou do recesso com a exibição do filme “Ôrí” (Brasil, 1989), de Raquel Gerber, no Auditório Manoel Maurício/CFCH. Após a exibição, tivemos a palestra Pensar as vozes do currículo: gênero, raça e território, ministrada por Nastassja Pugliese, doutora em Filosofia pela University of Georgia (EUA), professora da Faculdade de Educação da UFRJ e coordenadora da Cátedra UNESCO para a História das Mulheres na Filosofia, Ciências e Cultura, sediada na UFRJ, em conjunto com Diego Matos Gondim, doutor em Filosofia pela Université Paris VIII (França) e professor do Departamento de Ciências Exatas, Biológicas e da Terra (PEB/UFF) e do PPGE/UFRJ.
O documentário, dirigido pela socióloga Raquel Gerber, usa da narrativa e voz de Beatriz Nascimento, historiadora e figura incontornável da militância do movimento negro no Brasil. O filme navega e examina de forma profunda os eventos e a história da resistência negra no país, principalmente contra as raízes coloniais, acompanhando a organização do movimento negro entre os anos 1977 e 1988, também mostrando suas origens e manifestações religiosas africanas, tendo como base a história da Beatriz Nascimento. A sessão foi realizada em parceria com a Cátedra UNESCO para a História das Mulheres na Filosofia, Ciências e Cultura.
A partir de uma iniciativa de resgate de obras de autoras brasileiras e vozes de minorias, Nastassja comentou sobre a importância de se promover uma nova composição do currículo, destacando como os aspectos de gênero, raça e território se entrelaçam com a educação contemporânea. O filme nos permite questionar a própria natureza do currículo e como as decisões sobre conteúdos pedagógicos moldam a experiência de formação dos alunos nas salas de aula. Ela procurou pensar de que maneira o filme contribui para uma ampliação e reflexão do enriquecimento do currículo escolar.
Diego Gondim leu um poema em homenagem à líder quilombola e ialorixá Mãe Bernardete, recentemente assassinada a tiros, assim como a própria Beatriz Nascimento, na década de 90.
O título ‘Ôrí’ significa “cabeça” em iorubá, e faz referência à sacralidade dentro de cada um. Na contramão da visão iluminista, na qual a cabeça é lugar da razão, da produção intelectual, o significado atribuído no filme mostra uma outra forma de representação deste lugar, da racionalidade: a parte do corpo mais próxima ao divino não é só espaço da razão, da pureza do intelecto,, mas também da imaginação, dos afetos, do movimento. Nastassja também fez referência às heranças religiosas de matriz africana apresentadas no filme, evocando um texto de Bernardo Oliveira (também professor da Faculdade de Educação). Raquel Gerber mostra, em Ôrí, a macumba como um instrumento essencial para se entender entender a produção e organização do movimento negro no Brasil, mas também como uma religião na qual se driblaria qualquer identidade estável.
Beatriz Nascimento também atribui ao quilombo um novo significado, ao reinterpretá-lo como um lugar de sacralidade e resistência não apenas localizado, concreto, mas também existencial. Desta forma, ela retira este espaço da negatividade colonial, aproximando-o de um lugar aberto ao possível, à liberdade e atuante na produção e formação da nacionalidade. Nesse contexto, Beatriz também marca este espaço como lugar de pertencimento do corpo, produtor de histórias e ancestralidades: “a terra é meu quilombo, o espaço é meu quilombo; onde eu estou, eu estou, onde eu estou, eu sou”. Outro lugar de pertencimento evocado no filme é o oceano, espaço imenso e caro a diáspora forçada africana para o Brasil. Para Diego, a diretora faz um jogo de imagens que compõem uma metafísica transatlântica da negritude. A interligação das imagens e a justaposição de determinadas cenas são recursos para narrar o pertencimento e o reconhecimento interno deste corpo que é documento: “corpo-mapa de um país longínquo que busca outras fronteiras que limitem a conquista de mim.”.
A pedagogia de ‘Ôrí’ reside na imagem em estado de hipnose, caracterizada pela sua tendência à evasão, sua natureza efêmera, subvertendo bases epistemológicas tradicionais. ‘Ôrí’ se mostra contemporâneo e essencial para mobilizar a urgência da implementação de currículos anti-coloniais, convocando a história e a cultura afro-brasileira. O filme ressignifica, sob o olhar de uma socióloga e uma historiaora e militante, histórias e experiências do movimento negro, mostrando-o como um lugar de resistência não só corporal e político,mas ancestral, produtor de pertencimento, conhecimento.
“Resgatar a imagem pra resgatar a identidade, pois o corpo de um é o reflexo do outro”.
A próxima sessão do cineclube ocorrerá no mês de Outubro. A programação será divulgada em breve. Siga o projeto no Instagram, no Facebook e no Twitter para atualizações e mais informações. Até breve!
Redação: Rafaela Filgueiras – bolsista PIBIAC do projeto Pedagogias da Imagem
Fotos: Gabriel Cid –coordenador do projeto Pedagogias da Imagem
Agradecimentos: CFCH Raquel Gerber Nastassja Pugliese Diego Matos Gondim
Sessão de agosto/2023 com Nastassja Pugliese e Diego Matos Gondim.