A Nuvem Rosa (2021), longa da brasileira Iuli Gerbase, trata de uma nuvem tóxica que acomete diversas partes do planeta e mata qualquer pessoa que a inale em até 10 segundos. A letalidade desse fenômeno gera o confinamento em todo o mundo. A história foca na protagonista Giovana, que precisa passar o confinamento com uma pessoa que havia acabado de conhecer em uma festa, Yago. O filme mostra cenas de medo, dúvida, comemorações de aniversário virtuais, entre outros eventos aos quais nos acostumamos durante a pandemia da Covid-19. O fato curioso é que o longa foi escrito por Iuli em 2019, antes do surto pandêmico.
Para além de sua coincidência assustadora com o cenário mundial, o filme parece transparecer um imaginário brasileiro coletivo de catástrofes e sensação de apocalipse sentidas no cenário político atual, como as muitas produções audiovisuais que, após o acidente de Chernobyl, passaram a trazer histórias de fenômenos sobrenaturais que envolviam usinas nucleares, como uma resposta inconsciente a um trauma social. Exemplos atuais são as séries Dark (2017) e Twin Peaks (1990).
No movimento barroco hispano-americano, era característica a estrutura formal de poesia que escondia, em sua carregada simbologia e cunho metafórico, desejos e frustrações decorrentes de ansiedades, repressão social e preconceitos que encaramos até hoje. A temática do medo de um mal iminente não é estranha ao cinema. Muitos teóricos acreditam que filmes do Expressionismo Alemão como O Gabinete do Dr. Caligari (1920) e M, o Vampiro de Dusseldorf (1931), que possuem narrativas que envolvem assassinato, culpa e mistério, carregam em si um vislumbre do cenário social que, de certa forma, previu a chegada do nazismo.
A temática do confinamento pode trazer escondida em si a questão da solidão, problemáticas dos relacionamentos contemporâneos e um medo coletivo referente ao cenário político e social atual. Estes fatores se apresentam de forma urgente como possíveis catástrofes naturais que apontam uma impossibilidade de existir no mundo e de exercer liberdade. Ou seja, um possível reflexo de prisões sociais que impedem o exercício da cidadania, como a desigualdade entre classes sociais e discursos de ódio cristalizados. Para além de ser “um mosaico do tempo”, como dito por Tarkovsky, o cinema também pode ser uma máquina de processar emoções.
A Nuvem Rosa foi produzido pela Prana Filmes e exibido nos festivais de Sundance, Miami Film Festival, Sofia International Film Festival e Chicago Latino Film Festival.
Redação: Mariane Germano
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