O surgimento do cinema drive-in

“O último Cine Drive-in” (2015), de Iberê Carvalho

Inicialmente, a ideia de cinemas ao ar livre surgiu na cidade de Las Cruces, no México, por volta de 1915. Porém, só no início dos anos 1930 nos Estado Unidos, ganhou maior projeção quando passou a ser drive-in (em estacionamentos), quando Richard M. Hollingshead Jr. de acordo com a história, já cansado das queixas de sua mãe que estava acima do peso e reclamava dos assentos dos cinemas regulares, pois ela se sentia muito desconfortável, ao contrário dos assentos de seu carro, ele resolveu inovar para agradá-la.

Richard começou a fazer várias experiências na garagem de sua casa. Ele pendurou dois lençois entre duas árvores, usou um projetor Kodak modelo 1928, e estacionou o carro de frente para ela, alinhou outros carros para testar a logística, ângulos e elevações de cada vaga de estacionamento. Ele experimentou por vários anos e após vários testes criou um sistema de rampas para os carros estacionarem com a frente elevada, e assim usufruírem de uma melhor visualização da tela, sem serem bloqueados por outros veículos. 

Ele patenteou seu plano de cinema drive-in em maio de 1933 e abriu as portas de seu teatro no mês seguinte. Veja a seguir o pedido de patente solicitado em agosto de 1932: 

Minha invenção se refere a um novo e útil teatro ao ar livre e, mais particularmente, a uma nova construção em teatros ao ar livre, em que os meios de transporte de e para o teatro são feitos para constituir um elemento dos assentos do teatro. . . em que o desempenho, como um filme de cinema ou semelhante, pode ser visto e ouvido de uma série de automóveis dispostos em relação ao palco ou tela, de modo que os carros sucessivos um atrás do outro não obstruam a visão.

HOLLINGSHEAD, 1932

Esse novo estilo de ver filme teve o seu auge nos anos 50 e 60, principalmente. Nos EUA, nesse período, contou com mais de 4 mil espaços funcionando como drive-in. 

Na década de 1940, a qualidade do som foi melhorada, pois o som não era mais os que saiam dos alto falantes ou caixas de som que reduziam a qualidade ou dessincronizam com o filme. Foi quando os carros passaram a ter equipamentos de som e era somente sintonizar na rádio estabelecida pelo local que você podia ouvir o áudio do seu próprio automóvel, acompanhando com a imagem do telão. 

Em sua maioria, os estacionamentos que funcionavam para a exibição de filmes estavam nas áreas rurais, fato que fez com que aumentasse o público que tinha acesso ao cinema. As sessões sofriam certa restrição pois, por ser um país que possui épocas com passagem de furacões e invernos rigorosos, não podiam funcionar nesse período. E, ainda, como só podiam funcionar à noite, eram poucos filmes que podiam ser exibidos, no máximo dois por dia.

E no Brasil, os drive-ins chegaram apenas no fim dos anos 60. Em 1973, foi instalado, em Brasília, o Cine Drive-in, que funciona até hoje. 

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O último Cine Drive-in, de Iberê Carvalho (2015)

“O último Cine Drive-in” (2015), de Iberê Carvalho

Poeticamente, o tradicional modelo de cinema que se popularizou no período pandêmico pode ser visto na produção brasiliense “O Último Cine Drive-in”, de Iberê Carvalho. O longa-metragem, lançado em 2015, ganhou espaço no catálogo da Netflix após vencer um prêmio que o disponibilizou para mais de 190 países no streaming. A narrativa conta com o morador de Anápolis (GO), Marlombrando (Breno Nina) como protagonista. O jovem vai a Brasília para que sua mãe se submeta a tratamento médico e, na viagem, vai de encontro com seu pai, que é dono do último cinema drive-in do Brasil, localizado no plano piloto da capital brasileira. A insistência e resistência de Almeida, dono do cinema, para manter viva a cultura do cinema drive-in, abandonado e sucateado, emociona em meio aos dramas que envolvem a relação familiar de Marlom e Almeida. O abandono da cultura do país é tratada com certa fidelidade e a movimentação do governo para ocupar o grande terreno em uma área valorizada com algo mais “rentável” nos remete a outras produções, como Aquarius, de Kleber Mendonça Filho, lançado no mesmo ano. Em uma cena do filme, a personagem XXX diz: “Aqui é o único lugar que dá pra ver o filme e as estrelas”. 

A fotografia do filme valoriza as cores e a paisagem candanga. Assinado por André Cavalheira, o trabalho funciona ao trazer a poética das cenas silenciosas, do roteiro simples e melancólico muitas vezes. Nesses silêncios e diálogos sinceros, pai e filho desenvolvem uma nova relação e os personagens coadjuvantes também surgem com muita potência, como a personagem Paula, que rendeu prêmios como o do Festival do Rio em 2014, para a atriz Fernanda Rocha.

Com um tom documental que norteia as dificuldades de manter um equipamento cultural com público escasso, o longa chamou a atenção de espectadores do país inteiro. Em 2018, o Drive-in brasiliense ganhou o título de Patrimônio Cultural e Material do Distrito Federal, e a produção levou para casa o Kikito de melhor filme no Festival de Gramado no ano de lançamento.

A estrela do longa sofreu e ainda sofre uma série de ameaças, é verdade. Mas com a nova consolidação do modelo Drive-in, talvez o equipamento instalado no Autódromo Internacional Nelson Piquet, na Asa Norte, ganhe vida, reconhecimento e valorização. Celebremos a cultura!

Redação:

Cristiana Correa

Alice Corrêa

ー Extensionistas do projeto Pedagogias da Imagem