No dia 20/6, no Auditório Manoel Maurício, do Centro de Filosofia e Ciências Humanas (CFCH), aconteceu a exibição do filme “Dr. Fantástico” (Dr. Strangelove or: how I learned to stop worrying and love the bomb – EUA/Reino Unido, 1964), de Stanley Kubrick, seguido da palestra “Estranhamor e os fins do mundo”, ministrada por Herli Joaquim de Menezes, mestre em Ciências da Computação/Sistemas de Informação pela UNIRIO, graduado em Física pela UFRJ. Professor da Faculdade de Educação da UFRJ e atua com pesquisa sobre redes neurais e processamento de linguagem natural.
Indicado à categoria Melhor Filme no Oscar de 1965 e baseado no livro ‘Red alert’, de Peter George, a narrativa desenvolvida por Stanley Kubrick acompanha os esforços do presidente dos EUA e do líder soviético, em meio ao período da Guerra Fria, para evitar as consequências de um ataque nuclear liderado por um general insano – que acreditava que os comunistas queriam dominar o mundo – capaz de ocasionar o fim do mundo.
Herli iniciou a conversa apresentando o contexto por trás da obra: o filme foi feito em 1962, anos após o fim da Segunda Guerra Mundial e do Plano Marshall, da corrida nuclear, e sob o panorama da Guerra Fria – o que explica a sátira de Kubrick ao retratar estadunidenses preocupados com uma ameaça comunista iminente, assim como a polarização, tratada com ironia, entre “Nós” (os bons, estadunidenses) e “Eles” (os maus, comunistas). Desse modo, o filme acontece em 3 núcleos: a sala de guerra, com o presidente e seus assessores; a sala do general Ripper (nome que faz referência ao “Jack, the Ripper” – o estripador), responsável por ordenar o ataque das bombas rumo à União Soviética; e, por fim, o avião B-52 indo em direção ao alvo para lançar a bomba. A estrutura dramática se consolida nesses ambientes assim como as ações, que muitas vezes não se completam, pulando para outro núcleo antes de finalizar, construindo uma atmosfera de tensão pela montagem. O palestrante chama a atenção para a estrutura não-clássica da narrativa, sem um retorno à harmonia ou algum clímax redentor, a não ser o final improvável. Com isso, por meio do absurdo e do distanciamento pela sátira, Kubrick permite ao espectador um reconhecimento crítico daquilo que é vivenciado na realidade.
Desse modo, ele brinca com a ideia da possibilidade de algo não sair como o esperado, apesar dos esforços dos personagens, utilizando-se da comédia para evocar questões políticas e sociais. Herli mencionou o fato de o filme ser premonitório: ele anunciava acontecimentos que, na época, ninguém considerava possíveis, explicitando os perigos de decisões tomadas por uma pessoa só, nas quais estaria traçado também o destino da humanidade.
Herli também destacou a presença dos computadores no filme, a perda de controle da máquina. Em uma cena do filme, o Dr. Fantástico afirma que um computador poderia escolher quem faria parte de uma possível nova civilização, encenando uma tensão capaz de dar a ver quem de fato é controlado. Ao fazer um salto para nossos dias, Herli comentou sobre a falta de controle no cenário das big techs, com a produção de dados no contexto da internet e dispositivos móveis. Para ele, se não pensarmos na democratização do acesso aos dados, seremos prisioneiros deles e das grandes empresas que os gerenciam.
Por meio de elementos implícitos das cenas, Kubrick não só chama atenção para o contexto da época, como também incorpora o absurdo para tratar de temas que transbordam para a realidade. Temas como alienação – por exemplo, nas ordens cumpridas sem avaliação, não importando o grau de ameaça envolvido –, o despreparo dos governantes – as pessoas que compunham a sala de guerra e o próprio general Ripper, tomando decisões insanas, tornando a comunicação impossível –, o capitalismo, a guerra sem sentido… O palestrante lembrou uma frase de Gabriel García Márquez: “há coisas que escapam da clarividência”. No entanto, para Herli, são poucas as coisas que escapam ao Kubrick – mesmo sendo um filme de 1962, ele consegue se fazer presente e potente na atualidade.
A próxima sessão do cineclube ocorrerá no mês de Agosto. A programação será divulgada em breve. Siga o projeto no Instagram, no Facebook e no Twitter para atualizações e mais informações. Até breve!
Redação:
Rafaela Filgueiras – bolsista PIBIAC do projeto Pedagogias da Imagem
Fotos:
Gabriel Cid – coordenador do projeto Pedagogias da Imagem
Agradecimentos:
CFCH
Herli Joaquim de Menezes