No dia 24, última terça-feira do mês, teremos a sessão de setembro do cineclube Pedagogias da Imagem. Exibiremos o filme Ruído (Ruido, 2022), de Natalia Beristáin, co-produção da Argentina e do México que acompanha a busca de uma mãe por sua jovem filha desaparecida, mostrando seu encontro com uma rede de apoio e com diferentes histórias de vidas marcadas pela crescente violência contra as mulheres. O filme participou da mostra Horizontes Latinos na 70ª edição do Festival de San Sebastián, na Espanha onde obteve o VIII Prêmio da Cooperação Espanhola.
Teremos a alegria e a honra de receber novamente, como convidada do mês, a filósofa Susana de Castro, professora titular do Departamento de Filosofia e do Programa de Pós-Graduação em Filosofia da UFRJ. Ela é doutora em Filosofia pela Ludwig-Maximilians-Universität, Munique, com pós-doutorado em Filosofia na CUNY Graduate Center, Nova York. Autora, dentre outros, do livro ‘Filosofia e Gênero’ (2014). Integrante do GT Filosofia e Gênero, da Anpof – Associação Nacional de Pós-Graduação em Filosofia.
O encontro será um convite para refletir sobre a escalada da violência contra as mulheres em meio à guerra entre cartéis do narcotráfico no México, partindo deste cenário para explorar relações, estruturas e significados entre essa intensificação da violência, o machismo e a lógica do patriarcado.
A sessão acontece no Auditório Manoel Maurício, do Centro de Filosofia e Ciências Humanas (CFCH). A entrada é franca e a atividade é voltada para o público geral, indicada para pessoas a partir de 12 anos. Faça sua inscrição aqui. Aproveite para seguir o cineclube no Instagram, no Bluesky e no Threads. Será ótimo contar com qualquer apoio na divulgação.
Caso queira receber nossas divulgações e comunicados via WhatsApp, venha fazer parte do nosso grupo (restrito ao envio de divulgações). É só acessar este link-convite.
No dia 27/08, o Cineclube Pedagogias da Imagem, projeto de extensão da Faculdade de Educação da UFRJ, voltou do recesso com a primeira sessão do segundo semestre de 2024, apresentando o filme Sala dos professores (Alemanha, 2023), de İlker Çatak, no Auditório Manoel Maurício/CFCH. Para debater acerca do filme, a professora, filósofa e cineasta Angela Donini foi convidada para o encontro. Ela apresentou a palestra O colapso das relações no espaço educacional e a urgência de novos repertórios.
Provocando uma claustrofobia intencional, o filme se debruça sobre o drama de um aluno em ver sua mãe – uma professora da escola que dá palco à trama -, sendo acusada de um roubo pela também docente e protagonista, Carla Nowak, levantando um intenso debate sobre o apagamento do outro no ambiente estudantil, assim como sobre o lugar das promessas da educação diante de suas limitações enquanto produto do sistema.
No debate, um dos temas de maior importância foi a dinâmica do universo encapsulado: o filme é todo ambientado na escola; o enquadramento aperta o espectador, sua música o tensiona. O filme constrói, de maneira muito precisa, a ideia de um lugar sem saída, trazendo reflexões sobre como solucionar os problemas da pedagogia senão pela superação dos lugares de hierarquização, onde instintos são moldados e alunos são compreendidos somente na medida em que se submetem ao ordenamento moral. As barreiras impostas pelo modo (re)produtivista da escola estão em todas as suas instâncias, desde o tratamento da direção até nos próprios estudantes.
A naturalização do distanciamento dos docentes e gestores é mostrada, pela convidada, como uma ontologia não-relacional, a partir da qual se vislumbra uma exclusão das relações e afetos que constituem as personagens.. Tudo isso constitui um cenário de intolerância, onde nada é questionado e, portanto, nada é elaborado nem trabalhado. Mesmo assim, Carla busca atravessar as barreiras que a tornam tão distante de seus discentes usando uma das poucas armas que lhe restam – o afeto –, ao mesmo tempo em que também é vítima desse sistema. Carla, com sua sensibilidade, acaba atuando como uma possível resistência destas diretivas.
Angela Donini demonstra que, por mais que a professora tenha buscado uma abordagem empática, a estrutura educacional colapsa justamente porque é uma reprodução da sociedade, na qual a gestão da escola opta por fazer acordo com a polícia e a pedagogia policialesca mostrada ao longo da obra, justamente porque é a reprodução incontrolável do capital e a escola funciona enquanto uma aparelho ideológico do Estado que reproduz uma submissão aos discentes e poder aos professores.
A partir do filme Sala dos professores, podemos pensar em projetos exteriores à escola, capazes de produzir individualidade e subjetivações por meio da inclusão de crianças e adolescentes a partir de outras formas de acolhimento, que promovam a correlação entre arte, cultura e o espaço escolar, instrumentos de aproximação e reconhecimento, produzindo novas lugares éticos de produção de saberes e cuidados.
Nossa próxima sessão acontecerá no dia 24 de setembro, às 17h. Exibiremos o filme Ruído (Ruido – Argentina/México), de Natalie Beristain, seguido da palestra O caso dos narco-feminicídios no México, com a filósofa Susana de Castro (UFRJ). Anote e siga o projeto no Instagram, no Bluesky e no Threads para mais atualizações.
Redação: Julia Facundo Isabela Felippe – Extensionistas do projeto Pedagogias da Imagem
Fotos: Carolina Moreira – Extensionista do projeto Pedagogias da Imagem
Estamos de volta! Nesta última terça de agosto, 27/8, às 17h, acontecerá a sessão inaugural do semestre do cineclube Pedagogias da Imagem. Exibiremos o filme A sala dos professores (Das Lehrerzimmer – Alemanha/EUA, 2023), do diretor Ilker Çatak.
Indicado ao Oscar de Melhor Filme Estrangeiro, o filme acompanha a professora Carla Nowak (Leonie Benesch), envolta em uma rede de tensões disparada por uma série de roubos, acusações e preconceitos no ambiente escolar. O filme foi premiado em seis categorias no Prêmio do Filme Alemão (Deutscher Filmpreis) no ano passado: Melhor Filme, Diretor, Roteiro, Atriz e Edição.
Teremos a alegria e a honra de receber, como convidada do mês, a filósofa e cineasta Angela Donini, professora do Departamento de Filosofia da UNIRIO, do Mestrado Profissional em Filosofia e do Programa de Ensino de Artes Cênicas, também da UNIRIO. Ela dirigiu os curtas ‘Corpos que escapam’ (2015), ‘Ancorando navios no espaço’ (2016), ‘Nomes que importam’ (2017) e ‘Que minhas únicas cicatrizes sejam de sk8’ (2023). Ela é Doutora em Psicologia Clínica pela PUC-SP, com pós-doutorados em Medicina Social (UERJ) e em Estudos Contemporâneos das Artes (UFF).
O encontro será um convite para dialogarmos sobre a urgência em construirmos novos repertórios imaginativos e práticos para as relações que se estabelecem nos espaços educacionais.
A sessão acontece no Auditório Manoel Maurício, do Centro de Filosofia e Ciências Humanas (CFCH), campus Praia Vermelha da UFRJ. A entrada é franca e a atividade é voltada para o público geral, indicada para pessoas a partir de 12 anos.
Caso queira receber nossas divulgações e comunicados via WhatsApp, venha fazer parte do nosso grupo (restrito ao envio de divulgações). É só acessar este link-convite.
No dia 30/8, o Cineclube Pedagogias da Imagem retornou do recesso com a exibição do filme “Ôrí” (Brasil, 1989), de Raquel Gerber, no Auditório Manoel Maurício/CFCH. Após a exibição, tivemos a palestra Pensar as vozes do currículo: gênero, raça e território, ministrada por Nastassja Pugliese, doutora em Filosofia pela University of Georgia (EUA), professora da Faculdade de Educação da UFRJ e coordenadora da Cátedra UNESCO para a História das Mulheres na Filosofia, Ciências e Cultura, sediada na UFRJ, em conjunto com Diego Matos Gondim, doutor em Filosofia pela Université Paris VIII (França) e professor do Departamento de Ciências Exatas, Biológicas e da Terra (PEB/UFF) e do PPGE/UFRJ.
O documentário, dirigido pela socióloga Raquel Gerber, usa da narrativa e voz de Beatriz Nascimento, historiadora e figura incontornável da militância do movimento negro no Brasil. O filme navega e examina de forma profunda os eventos e a história da resistência negra no país, principalmente contra as raízes coloniais, acompanhando a organização do movimento negro entre os anos 1977 e 1988, também mostrando suas origens e manifestações religiosas africanas, tendo como base a história da Beatriz Nascimento. A sessão foi realizada em parceria com a Cátedra UNESCO para a História das Mulheres na Filosofia, Ciências e Cultura.
A partir de uma iniciativa de resgate de obras de autoras brasileiras e vozes de minorias, Nastassja comentou sobre a importância de se promover uma nova composição do currículo, destacando como os aspectos de gênero, raça e território se entrelaçam com a educação contemporânea. O filme nos permite questionar a própria natureza do currículo e como as decisões sobre conteúdos pedagógicos moldam a experiência de formação dos alunos nas salas de aula. Ela procurou pensar de que maneira o filme contribui para uma ampliação e reflexão do enriquecimento do currículo escolar.
Diego Gondim leu um poema em homenagem à líder quilombola e ialorixá Mãe Bernardete, recentemente assassinada a tiros, assim como a própria Beatriz Nascimento, na década de 90.
O título ‘Ôrí’ significa “cabeça” em iorubá, e faz referência à sacralidade dentro de cada um. Na contramão da visão iluminista, na qual a cabeça é lugar da razão, da produção intelectual, o significado atribuído no filme mostra uma outra forma de representação deste lugar, da racionalidade: a parte do corpo mais próxima ao divino não é só espaço da razão, da pureza do intelecto,, mas também da imaginação, dos afetos, do movimento. Nastassja também fez referência às heranças religiosas de matriz africana apresentadas no filme, evocando um texto de Bernardo Oliveira (também professor da Faculdade de Educação). Raquel Gerber mostra, em Ôrí, a macumba como um instrumento essencial para se entender entender a produção e organização do movimento negro no Brasil, mas também como uma religião na qual se driblaria qualquer identidade estável.
Beatriz Nascimento também atribui ao quilombo um novo significado, ao reinterpretá-lo como um lugar de sacralidade e resistência não apenas localizado, concreto, mas também existencial. Desta forma, ela retira este espaço da negatividade colonial, aproximando-o de um lugar aberto ao possível, à liberdade e atuante na produção e formação da nacionalidade. Nesse contexto, Beatriz também marca este espaço como lugar de pertencimento do corpo, produtor de histórias e ancestralidades: “a terra é meu quilombo, o espaço é meu quilombo; onde eu estou, eu estou, onde eu estou, eu sou”. Outro lugar de pertencimento evocado no filme é o oceano, espaço imenso e caro a diáspora forçada africana para o Brasil. Para Diego, a diretora faz um jogo de imagens que compõem uma metafísica transatlântica da negritude. A interligação das imagens e a justaposição de determinadas cenas são recursos para narrar o pertencimento e o reconhecimento interno deste corpo que é documento: “corpo-mapa de um país longínquo que busca outras fronteiras que limitem a conquista de mim.”.
A pedagogia de ‘Ôrí’ reside na imagem em estado de hipnose, caracterizada pela sua tendência à evasão, sua natureza efêmera, subvertendo bases epistemológicas tradicionais. ‘Ôrí’ se mostra contemporâneo e essencial para mobilizar a urgência da implementação de currículos anti-coloniais, convocando a história e a cultura afro-brasileira. O filme ressignifica, sob o olhar de uma socióloga e uma historiaora e militante, histórias e experiências do movimento negro, mostrando-o como um lugar de resistência não só corporal e político,mas ancestral, produtor de pertencimento, conhecimento.
“Resgatar a imagem pra resgatar a identidade, pois o corpo de um é o reflexo do outro”.
A próxima sessão do cineclube ocorrerá no mês de Outubro. A programação será divulgada em breve. Siga o projeto no Instagram, no Facebook e no Twitter para atualizações e mais informações. Até breve!
Redação: Rafaela Filgueiras – bolsista PIBIAC do projeto Pedagogias da Imagem
Fotos: Gabriel Cid –coordenador do projeto Pedagogias da Imagem
Agradecimentos: CFCH Raquel Gerber Nastassja Pugliese Diego Matos Gondim
Sessão de agosto/2023 com Nastassja Pugliese e Diego Matos Gondim.
No dia 20/6, no Auditório Manoel Maurício, do Centro de Filosofia e Ciências Humanas (CFCH), aconteceu a exibição do filme “Dr. Fantástico” (Dr. Strangelove or: how I learned to stop worrying and love the bomb – EUA/Reino Unido, 1964), de Stanley Kubrick, seguido da palestra “Estranhamor e os fins do mundo”, ministrada por Herli Joaquim de Menezes, mestre em Ciências da Computação/Sistemas de Informação pela UNIRIO, graduado em Física pela UFRJ. Professor da Faculdade de Educação da UFRJ e atua com pesquisa sobre redes neurais e processamento de linguagem natural.
Indicado à categoria Melhor Filme no Oscar de 1965 e baseado no livro ‘Red alert’, de Peter George, a narrativa desenvolvida por Stanley Kubrick acompanha os esforços do presidente dos EUA e do líder soviético, em meio ao período da Guerra Fria, para evitar as consequências de um ataque nuclear liderado por um general insano – que acreditava que os comunistas queriam dominar o mundo – capaz de ocasionar o fim do mundo.
Herli iniciou a conversa apresentando o contexto por trás da obra: o filme foi feito em 1962, anos após o fim da Segunda Guerra Mundial e do Plano Marshall, da corrida nuclear, e sob o panorama da Guerra Fria – o que explica a sátira de Kubrick ao retratar estadunidenses preocupados com uma ameaça comunista iminente, assim como a polarização, tratada com ironia, entre “Nós” (os bons, estadunidenses) e “Eles” (os maus, comunistas). Desse modo, o filme acontece em 3 núcleos: a sala de guerra, com o presidente e seus assessores; a sala do general Ripper (nome que faz referência ao “Jack, the Ripper” – o estripador), responsável por ordenar o ataque das bombas rumo à União Soviética; e, por fim, o avião B-52 indo em direção ao alvo para lançar a bomba. A estrutura dramática se consolida nesses ambientes assim como as ações, que muitas vezes não se completam, pulando para outro núcleo antes de finalizar, construindo uma atmosfera de tensão pela montagem. O palestrante chama a atenção para a estrutura não-clássica da narrativa, sem um retorno à harmonia ou algum clímax redentor, a não ser o final improvável. Com isso, por meio do absurdo e do distanciamento pela sátira, Kubrick permite ao espectador um reconhecimento crítico daquilo que é vivenciado na realidade.
Desse modo, ele brinca com a ideia da possibilidade de algo não sair como o esperado, apesar dos esforços dos personagens, utilizando-se da comédia para evocar questões políticas e sociais. Herli mencionou o fato de o filme ser premonitório: ele anunciava acontecimentos que, na época, ninguém considerava possíveis, explicitando os perigos de decisões tomadas por uma pessoa só, nas quais estaria traçado também o destino da humanidade.
Herli também destacou a presença dos computadores no filme, a perda de controle da máquina. Em uma cena do filme, o Dr. Fantástico afirma que um computador poderia escolher quem faria parte de uma possível nova civilização, encenando uma tensão capaz de dar a ver quem de fato é controlado. Ao fazer um salto para nossos dias, Herli comentou sobre a falta de controle no cenário das big techs, com a produção de dados no contexto da internet e dispositivos móveis. Para ele, se não pensarmos na democratização do acesso aos dados, seremos prisioneiros deles e das grandes empresas que os gerenciam.
Por meio de elementos implícitos das cenas, Kubrick não só chama atenção para o contexto da época, como também incorpora o absurdo para tratar de temas que transbordam para a realidade. Temas como alienação – por exemplo, nas ordens cumpridas sem avaliação, não importando o grau de ameaça envolvido –, o despreparo dos governantes – as pessoas que compunham a sala de guerra e o próprio general Ripper, tomando decisões insanas, tornando a comunicação impossível –, o capitalismo, a guerra sem sentido… O palestrante lembrou uma frase de Gabriel García Márquez: “há coisas que escapam da clarividência”. No entanto, para Herli, são poucas as coisas que escapam ao Kubrick – mesmo sendo um filme de 1962, ele consegue se fazer presente e potente na atualidade.
A próxima sessão do cineclube ocorrerá no mês de Agosto. A programação será divulgada em breve. Siga o projeto no Instagram, no Facebook e no Twitter para atualizações e mais informações. Até breve!
Redação: Rafaela Filgueiras – bolsista PIBIAC do projeto Pedagogias da Imagem
Fotos: Gabriel Cid –coordenador do projeto Pedagogias da Imagem
Agradecimentos: CFCH Herli Joaquim de Menezes
Sessão de junho/2023 com Herli Joaquim de Menezes.
Na sessão do dia 23/5, de volta ao Auditório Manoel Maurício, do Centro de Filosofia e Ciências Humanas (CFCH), tivemos a exibição do filme “Assunto de família” (Manbiki Kazoku – Japão, 2018) do diretor japonês Hirokazu Kore-eda, seguido da palestra “A família e suas imagens afetivas”, ministrada por Henrique Antoun, professor titular da ECO – UFRJ e do PPGCOM/UFRJ. Ganhador da Palma de Ouro em Cannes em 2018, o longa acompanha uma família não-tradicional moradora de uma grande metrópole que, após encontrarem uma menininha sozinha passando frio na rua, a levam para casa para cuidá-la. O filme mostra o cotidiano, as alegrias e os segredos de uma família tentando sobreviver por meio de pequenos furtos em meio a pobreza em uma área central no Japão.
Henrique Antoun, em sua palestra, explorou as imagens e articulações afetivas que o filme nos apresenta, pensando sobre a ideia de ‘família’, desdobrando elementos que apontam para formas mais espontâneas e diversas de parentesco, mais próximas da ideia de rede, para além da filiação e dos laços ditos naturais. Do ponto de vista do Estado, os personagens do filme não seriam uma família legítima, dada a inexistência de um vínculo sanguíneo. Então, como formar uma família no interior deste Estado? Ao escolherem acolher em sua casa uma menina que estava sozinha na rua – e, após perceberem que ela tinha marcas de abusos cometidos pela sua família sanguínea -, temos uma questão moral, pois, teoricamente, eles sequestram uma menina que tinha uma família, mas também a salvaram de uma realidade de abusos negligenciada pelo mesmo Estado, formando um novo tipo de arranjo familiar.
O diretor Kore-eda não julga os personagens, optando antes por descrever sua realidade e focar em outros dilemas. No longa, o Estado é falho em diversos sentidos – algo que se nota dadas as condições de vida da família, que pratica furtos de alimentos, vestimentas, ou seja, recursos básicos de sobrevivência, que poderiam ser providos, por exemplo, com a atenção do Estado. Para Antoun, faltaria honestidade, do ponto de vista estatal, enquanto sobraria sinceridade do ponto de vista familiar dos personagens.
Sendo assim, o filme trabalha com o conceito de “chosen family” – na tradução, ‘família escolhida’ – ao mostrar que relações podem ser construídas dentro de uma realidade precária e entre desconhecidos que, mesmo envoltos em um turbilhão de situações, mesmo com alguma moralidade distorcida, criam para si algum espaço afetivo, um ponto de partida para a criação de uma família. Kore-eda nos faz pensar, portanto, na nossa própria desconstrução moral, trabalhada com a delicadeza das relações, refletindo sobre como se constrói e se mantém o amor, além de discutir se existe, no limite, condição para se formar uma família. Deste modo, ele explora a ideia de rede associada à complexidade dos seres humanos, de suas relações, enfatizando que seria justamente no emaranhado destas relações que os vínculos se formam, se multiplicam e se perpetuam.
Redação: Rafaela Filgueiras – bolsista PIBIAC do projeto Pedagogias da Imagem
Fotos: Gabriel Cid –coordenador do projeto Pedagogias da Imagem
Na quarta-feira, 26 de abril, o Cineclube Pedagogias da Imagem retornou para sua primeira sessão do ano com o filme A história da eternidade (2014), de Camilo Cavalcante. Após a exibição, tivemos a palestra O outro em tempos outros: ressonâncias entre o cinema e a educação, com a convidada Andreza Berti, doutora em educação pela UFRJ e diretora adjunta de ensino do CAp-UFRJ.
No primeiro longa-metragem do diretor pernambucano, a narrativa ficcional acompanha a vida que pulsa em meios às tensões e limitações de moradores de um pequeno vilarejo no sertão, centrada na história de três mulheres: Alfonsina, adolescente, que tem o sonho de conhecer o mar; Querência, adulta, que está passando pelo luto após perder seu filho; e Das Dores, idosa, que reencontra seu neto de São Paulo, depois de anos. A história se divide como em contos, mas interligada de alguma forma, tendo o sertão como pano de fundo e incorporando influências de fábulas nordestinas na narrativa.
Andreza iniciou sua fala estimulando o público a pensar sobre nossa experiência da relação com o outro, com a alteridade apresentada ao longo da projeção. Quais afetos foram mobilizados na presença do outro? De acordo com a pesquisadora, é a experiência que permite o exercício do pensamento, a partir do olhar atento sobre as coisas. A partir do movimento exploratório do pensamento sobre o lugar em que se vive, é possível enxergar a maneira pela qual nos posicionamos no mundo, o lugar ao qual pertencemos, e, ao mesmo tempo, onde a alteridade e a diferença também habitam. Ao adotar esse olhar mais atento, percebemos a presença do outro não só neste próprio lugar, mas também como agente do significado construído a partir deste olhar. Ela nos convida, então, para entrar neste lugar e nos tornarmos outros, não no sentido de uma apropriação do lugar do outro, mas de uma abertura para a diferença oferecida pelo cinema.
Dito isso, o papel que o cinema exerce na composição desse olhar se dá por meio da lente do filme, a vista pela qual olhamos. Ao assistir um filme, assistimos tudo pela perspectiva do olhar que nos é apresentado. As perguntas que surgem são geradas a partir do exercício do pensamento no encontro com as imagens. O papel do cineasta, portanto, seria o de criar a relação entre o filme e quem está vendo por meio da gênese de novos mundos, de novas relações e pensamentos, instigando-nos a formular novas perguntas a partir do que se vê. Sendo assim, o diretor Camilo Cavalcante nos presenteia com novos olhares: o filme se dá por longos e demorados planos abertos que nos convidam a ver e a sentir de outra forma as coisas e o outro, afastando-nos da familiaridade das identificações.
Andreza fez menção a uma das cenas mais marcantes do filme, na qual Joãozinho, personagem de Irandhir Santos, performa ao som da música “Fala” – da banda Secos e Molhados -, diante de todo o vilarejo. Enquanto a câmera gira ao redor do artista, vemos todos os personagens do filme saírem de suas casas para vê-lo dançar. Deste modo, somos lançados em meio aos diferentes olhares e reações dos personagens, ao mesmo tempo em que construímos nosso olhar a partir das perspectivas do outro. Sendo assim, nas palavras da convidada, o cinema seria um elemento desestabilizador, produtor de afeto: ele promoveria um espaço de manifestação e encontro com a alteridade, ao multiplicar as experiências vividas a partir do contato com a diferença, nos fazendo pensar se ainda assim continuaríamos os mesmos. O filme de Cavalcante operaria desta forma: ele questiona nossos afetos, nossos juízos de valor, reenviando nossa presença para a posição de espectadores do outro, imersos no tempo do outro.
E por falar em tempo, outra pergunta nos sobrevém ao longo da palestra: o que fazemos com o tempo do agora? E o tempo das relações pedagógicas, quando mediadas pelo cinema e pelas artes? Para os espectadores de um filme, imersos em uma sala de exibição, o tempo se interrompe e o presente vira o instante do que é exibido, incluindo aí o acoplamento de pensamentos, sensações e imagens, a co-construção dos afetos através da narrativa e personagens. Sendo assim, da mesma maneira que Joãozinho conseguiu apresentar o mar para Alfonsina com o exercício da imaginação, o papel do cinema no espaço da educação se associa ao desafio de criar linhas de fuga, tempos e realidades capazes de criar reflexões e novos olhares para o mundo, para os outros, para o que está ao nosso redor.
A próxima sessão do cineclube ocorrerá neste mês de maio. A programação será divulgada em breve. Siga o projeto no Instagram, no Facebook e no Twitter para atualizações e mais informações. Até breve!
Redação: Rafaela Filgueiras – bolsista PIBIAC do projeto Pedagogias da Imagem
Fotos: Ananda Kropotoff – extensionista do projeto Pedagogias da Imagem
O ano de 2022 marcou a transição entre o período difícil dos últimos anos, com a memória do isolamento social, do temor da emergência sanitária e da interrupção de sessões presenciais do nosso projeto, e o tempo de retomada gradual de atividades. Desde 2020, nos defrontamos com desafios para a cena cineclubista, que precisou lançar mão de diferentes recursos, estratégias e gambiarras para seguir impulsionando e mantendo vivas as discussões, o interesse e o amor pelos filmes diante das ameaças e do horror da realidade cotidiana.
O cinema (e os cineclubes) resistiram. Ao longo de todos estes anos recentes, conversar sobre filmes, compartilhar conteúdos e debates mobilizadores da cinefilia, do pensamento crítico e da circulação de ideias, se converteram em ações necessárias não apenas para suportar o cotidiano, mas para promover também sua ressignificação pelas imagens, a expansão das nossas formas de perceber, experimentar e confrontar o mundo.
Ao longo de 2022, o cineclube Pedagogias da Imagem seguiu com suas sessões virtuais, transmitidas no Facebook da Faculdade de Educação da UFRJ, de janeiro a junho. Na sessão de janeiro, inauguramos o ano com a participação da Susana de Castro, professora do Programa de Pós-Graduação em Filosofia da UFRJ, apresentando uma conversa motivada pelo filme Alien, o oitavo passageiro (Alien, 1979), de Ridley Scott, intitulada Giger e Lovecraft: uma jornada no inconsciente.
No mês seguinte, a sessão de fevereiro contou com a parceria do PMAP – Programa de Monitoria e Apoio Pedagógico da Faculdade de Educação da UFRJ. Tivemos a alegria de contar com a participação da Teresa Gonçalves, professora da Faculdade de Educação da UFRJ, apresentando a fala Ensaio, verdade e ficção: considerações sobre o “impuro”, motivada pelo filme Jogo de cena (2007), de Eduardo Coutinho.
Na sessão de março, em ressonância com diversas ações que tradicionalmente colocam em foco a discriminação racial, tivemos uma conversa com Fábio José Paz da Rosa, hoje professor da UFRRJ. Ele ministrou a palestra Abolição ou vir a ser pelo que não foi dito, evocando questões em diálogo com o filme ‘Abolição’ (1988), de Zózimo Bulbul. Esta sessão marcaria o início dos trabalhos do ano de 2020, tendo sido programada para março daquele ano, e precisou ser suspensa devido à necessidade de isolamento.
No mês seguinte, na sessão de abril, recebemos o convidado José Ricardo Ramalho, professor titular do Depto. de Sociologia do IFCS/UFRJ e do Programa de Pós-Graduação em Ciências Sociais (PPGSA-UFRJ). Sua fala, intitulada Um necessário ato político de Ken Loach, desdobrou análises em torno do filme Você não estava aqui (2019), aproveitando para comentar sobre a filmografia e sobre os elementos potentes da obra do cineasta britânico.
Encerrando nosso ciclo de conversas virtuais, concluímos o semestre com a sessão de junho. Recebemos o convidado Wenceslao Oliveira Junior (professor da Faculdade de Educação da Unicamp e pesquisador do Laboratório de Estudos Audiovisuais OLHO), com a palestra Um filme na escola, vários cinemas da escola, desdobrada do filme Eleições (2018), da Alice Riff. Após esta sessão, e depois dos anos de isolamento, planejamos o retorno presencial das sessões para o segundo semestre.
Neste meio tempo, tivemos a notícia da morte do cineasta Jean-Luc Godard, que mobilizou nossas atenções e também a iniciativa de um retorno ao presencial com alguma sessão que o homenageasse. Foi assim que programamos a sessão especial SÉCULO GODARD, que aconteceu presencialmente no campus Praia Vermelha da UFRJ, em 11 de outubro. Exibimos o último longa-metragem do Godard, Imagem e palavra (2018), contando com as ilustres presenças de Jorge Vasconcellos (professor da UFF e autor do livro Deleuze e o cinema) e Ana Lúcia Soutto Mayor (professora aposentada do CAp-UFRJ, pesquisadora da Fiocruz e co-organizadora do livro Godard e a educação), para conversar com o público acerca do legado e da potência da obra do cineasta, atravessando diferentes áreas do conhecimento e campos de atuação.
Sessão de outubro, em homenagem ao Godard.
Depois de outubro, tivemos o encerramento das atividades deste ano atípico com chave de ouro, convocando e estimulando nossos anseios para um 2023 renovado. Em 14 de dezembro, tivemos a exibição do filme O botão de pérola (2015), de Patricio Guzmán. A força das imagens, aliada ao trabalho de roteiro do cineasta chileno, foi intensificada pela realização da sessão no auditório do CBPF, vizinho ao campus da UFRJ.
Sessão de encerramento do ano de 2022, com Andréa França.
Nesta sessão de encerramento, contamos com a participação da Andréa França, professora da PUC-Rio e doutora em Comunicação e Cultura pela ECO-UFRJ, apresentando a palestra Documentário e acontecimento histórico: (des)pedagogias da sensibilidade. A fala da Andréa, bem como o debate que se seguiu, aglutinaram diversas questões caras ao projeto, articulando a noção de pedagogia da imagem a uma (des)pedagogia, ao modo como os filmes se acercam do tempo e da história.
Deste modo, renovamos os votos para um 2023 de encontros, convidando o público para seguirmos apostando na renovação incessante do olhar oferecida pelos filmes, para os atravessamentos entre educação, cultura e ciências. Agradecemos a todas e todos que nos acompanharam em 2022. Vamos juntos, intensificando a relação entre cinema e pensamento, abrindo caminho para a transformação e ressignificação do mundo e de quem assiste e vivencia os filmes. Fiquem ligados em nossas redes e canais para saber mais sobre a programação de 2023.
Equipe e alguns participantes da sessão de encerramento da temporada 2022.
Fotos: Caio Wilbert – extensionista do projeto Pedagogias da Imagem.
É com alegria que o cineclube Pedagogias da Imagem apresenta e convida o público geral para participar do encontro ‘SÉCULO GODARD’, que acontecerá na terça-feira, dia 11 de outubro de 2022, no Salão Pedro Calmon, do Fórum de Ciência e Cultura, localizado no 2º andar do Palácio Universitário, campus Praia Vermelha (Av. Pasteur, 250 – Urca).
Para marcar a retomada das sessões presenciais do cineclube Pedagogias da Imagem, programamos uma sessão especial em homenagem ao cineasta Jean-Luc Godard, onde poderemos assistir coletivamente ao seu último longa-metragem, ‘Imagem e palavra’ (Le livre d’image – Suíça/França, 2018).
Ao longo de toda sua obra, e de uma vida de quase um século, Godard não apenas abriu caminhos para a inauguração/renovação da linguagem cinematográfica, da nouvelle vague ao cinema experimental, como também não cansou de se interrogar e de fazer os espectadores pensarem sobre as relações entre a imagem, o mundo, a arte e a política. Por isso, após a exibição do filme, teremos uma mesa composta por dois pesquisadores, cada um desdobrando a potência e o legado da contribuição de Godard em diferentes áreas.
Teremos a honra de contar com os seguintes convidados:
Ana Lucia Soutto Mayor Doutora em Letras pela UFF, pesquisadora no Laboratório de Iniciação Científica na Educação Básica (LIC-PROVOC) da Escola Politécnica de Saúde Joaquim Venâncio (Fiocruz), professora do Programa de Pós-Graduação Lato Sensu, no Curso de Ciência, Arte e Cultura na Saúde, do Instituto Oswaldo Cruz (IOC-Fiocruz), e professora aposentada do Colégio de Aplicação (CAp-UFRJ). Co-organizadora do livro ‘Godard e a educação’.
Jorge Vasconcellos Doutor em Filosofia pela UFRJ. Professor da UFF, no Departamento de Artes e Estudos Culturais/RAE e no Programa de Pós-graduação em Estudos Contemporâneos das Artes/PPGCA-IACS. Autor, entre outros, do livro ‘Deleuze e o cinema’, e de diversos artigos e capítulos sobre o cinema de Godard em perspectiva filosófica.
A entrada é franca. A atividade é voltada para o público a partir de 16 anos.
** Esta programação contará com intérpretes de Libras, com a colaboração da DIRAC/UFRJ.**
Declarações de participação serão emitidas mediante solicitação, para aqueles que desejarem.
O documentário Eleições (2018), dirigido por Alice Riff, é o escolhido para a sessão do mês de junho do Cineclube Pedagogias da Imagem, da Faculdade de Educação da UFRJ. Lançado em 2018, ano eleitoral tão marcante historicamente para o país, é também o ano em que a diretora documenta o dia a dia dos alunos da EscolaEstadual Doutor Alarico da Silveira no centro de São Paulo e as eleições do grêmio estudantil.
Ao longo do documentário, as dúvidas sobre o futuro, que apresenta tantas possibilidades e, ao mesmo tempo, é tão incerto, surgem entre os alunos. Se preparar para o ENEM, começar a traçar um plano para uma carreira profissional, que muitas vezes pode não atender aos interesses pessoais dos alunos, são decisões importantes que precisam ser tomadas tão cedo. É nesse clima que os jovens do documentário começam a compreender a importância de uma atitude política ativa.
Alice Riff constrói o documentário de forma em que os alunos estão envolvidos diretamente na produção, aproximando o espectador daquele cotidiano. Assim, ouvimos as propostas das chapas, percebemos o envolvimento crescente dos alunos, assim como a responsabilidade para o objetivo final de possibilitar uma escola diversificada, que reflita sobre seu corpo estudantil em todas as suas pluralidades.
As quatro chapas são compostas por alunos que se distinguem, com objetivos diversos e posicionamentos consistentes que amadurecem durante a campanha eleitoral escolar. Os espectadores são atravessados por suas próprias memórias e experiências durante o ensino médio, e são convidados a sentir a ansiedade durante a votação e revelação da chapa vencedora, vibrando, ao final, junto com a chapa vencedora, sentindo-se novamente na escola.
O documentário está disponível gratuitamente na plataforma Itaú Cultural Play e o cine Pedagogias da Imagem convida a todos para a sessão no dia 28 de junho, que irá desdobrar os pontos que o filme traz de forma tão espontânea, com a participação do convidado Wenceslao Machado de Oliveira Junior (FE/Unicamp), apresentando a fala ‘Um fime na escola, vários cinemas da escola’. Wenceslao vai propor um diálogo com o filme a partir dos encontros entre cinema e escola. Que escolas emergem desses encontros com o cinema? Que cinemas (e filmes) emergem destas experiências?
Redação: Stella Feitosa (Extensionista do projeto Pedagogias da Imagem)